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Sábado
26 de Outubro, 2020
Há palavras que de tão gastas já não dizem!
Em 2016
a jornalista Eliane Brum apontou em um texto que “a tragédia brasileira é que
as palavras existem, mas já não dizem”. Passados quatro anos, tal reflexão,
infelizmente, concretiza-se vertiginosamente. Palavras brotam empalhadas.
Não
importa a forma utilizada para expressão – escrita, falada, pichada, cantada,
etc. – palavras surgem gastas, anêmicas, despedaçadas, podres, secas, diante de
escutas que lhes negam acolhimento/colo. Escutar é dar colo as palavras. E, não
queiram os ouvidos monopolizar tal sentido, pois escutar se faz com o corpo
todo. No entanto, os dias acusam uma temporalidade acentuadamente reativa de expressões
“radioativas” – E daí?
A impermeabilidade dos sujeitos
mata palavras de sede nos falatórios sem escuta. Deprime observar: quando
ditas, não encontram o outro e despencam ao chão, espatifando-se pelo impacto
ou pisoteadas por quem já não ‘escuta’ por onde caminha.
Monólogo fantasiado de
diálogo onde o “eu” abafa o “nós” são ocasiões do empalhamento das palavras. Sendo-as
pronunciadas exclusivamente pelo cálculo racional da autopromoção, acabam
dissecadas por desafetadamente.
Portanto, palavras que deixam de dizer apontam o processo de “coisificação”; lembrando o dito “estamos trocando nossa humanidade por coisas” (Ailton Krenak). Onde há insensibilidade, a reciprocidade, arte-curativa das palavras, é cruelmente prejudicada já que sua transmissão depende do afeto por ela envolvido. Um “te amo” pode ser insípido enquanto um “oi” pode conter todos sabores. Como humanos temos o dever de resgatá-las, afetivamente partilhando-as em resistência. É pela partilha que dizem e vivem para além, sendo “metade de quem a pronuncia e metade de quem escuta” (Montaigne).
Dioglas André Marian Voltz
Psicólogo Clinico
CRP/RS 07/32186